sexta-feira, 19 de julho de 2019
Maria Odília Teixeira, a primeira médica negra do Brasil
Era 15 de dezembro de 1909, num Brasil machista e preconceituoso, quando Maria Odília Teixeira, baiana de São Félix do Paraguaçu, superou as estatísticas e formou-se em medicina, sendo a primeira médica negra do Brasil. Como se não bastasse o feito inédito para a sua raça, a médica foi também a primeira professora negra da Faculdade de Medicina da Bahia (cinco anos após conclusão de curso, lecionando Clínica Obstétrica), e inovou na sua tese inaugural quando pesquisou o tratamento da cirrose, enquanto as sete médicas anteriores debruçaram-se sobre tocoginecologia ou pediatria.
Seu pai, Dr. José Teixeira, era médico, mas de origem pobre; criou a família com muito sacrifício. E foi graças a ajuda de um dos irmãos (Tertuliano Teixeira), bacharel em Direito, que Maria Odília concluiu o curso de Medicina e tornou-se também a primeira mulher a ser diplomada em Medicina no Séc. XX.
“A humildade da família não foi uma barreira para o seu conhecimento cultural, muito pelo contrário. Minha mãe, sem nunca ter saído do Brasil, falava cinco línguas fluentemente, e não concebia como os professores ousavam ensinar o português, sem ao menos dominar o grego e o latim”, conta ao Cremeb o também médico José Leo Lavigne, um dos seus dois filhos.
O legado para a Medicina ultrapassa a pesquisa, docência e exercício da profissão quando o assunto gira em torno da Dra. Maria Odília Teixeira. Assim como o seu pai, ela segue sendo referência de conduta profissional para os demais familiares. Na carreira médica ela deixou um filho, dois netos e duas bisnetas, enquanto uma terceira bisneta cursa o sexto semestre da profissão. “Acredito que toda a minha paixão pelo cuidar veio da minha bisa Odília. Formar-se em Medicina sendo mulher negra há tanto tempo não deve ter sido fácil. Muita luta, muita força e muito amor”, detalha a bisneta Paula Lavigne, estudante de medicina.
“Exerceu a Medicina com dignidade, zelando pelos seus pacientes e respeitando a todos ao seu redor. Mulher meiga e forte, um exemplo de vida. Os seus passos também vêm guiando os meus”, conta a bisneta e médica oftalmologista, Luciana Lavigne. Já a bisneta Iana Lavigne, também médica oftalmologista, afirma ter “um estimado apreço e reconhecimento por sua honrosa história e trabalho, e isso se faz presente diariamente em minha vida profissional”.
A gana de uma mulher à frente do seu tempo era notória em diversas ações de Maria Odília. Ela encarou os feitos da ditadura do Estado Novo e defendeu sua família, em Ilhéus, em 1937, quando o seu marido Eusínio Gaston Lavigne teve o seu mandato de prefeito destituído. Quase trinta anos depois, em 1964, sofreu com a prisão de seu companheiro durante a ditadura militar. E, quando o político Ruy Santos planejou publicar um livro desmerecendo os feitos do seu pai – Teixeira Moleque, Ed. José Olympio, 1960 -, a primeira médica negra do Brasil lhe escreveu uma longa carta chamando atenção sobre o pretendia fazer.
Maria Odília, ao lado do seu marido, Eusínio Lavigne
Ao lembrar da referência cultural que a matriarca era para a família, um dos seus dois netos que seguiu a medicina, Eusínio Lavigne Neto, retoma um caso ainda da sua infância. “Certa feita, nós ganhamos uma gincana do colégio por causa dela. A missão era explicar a origem das nomenclaturas dos dias da semana, informação que não tinha nem enciclopédia Barsa. Não deu outra: ela sabia tudo e nós levamos a prova”, relembra.
Para dedicar-se à família, apesar de não haver exigência do marido, Dra. Maria Odília Teixeira abandonou a profissão médica. Naquela época, década de 1920, o movimento feminista acumulava os seus primeiros avanços e ainda não tinha obtido, por exemplo, direito ao voto para as mulheres. E foi nesse cenário que a primeira médica negra do Brasil escreveu o seu nome na história: com independência profissional, sendo exemplo para a juventude da sua família e símbolo de orgulho para a medicina, para as mulheres e para o povo negro.
fonte: www.cremeb.com.br
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