sábado, 28 de janeiro de 2012

Racismo no futebol gaúcho

Daniel FaveroDireto de Porto Alegre

Relembre Zé Roberto e outros casos de racismo no futebol gaúcho
O futebol gaúcho carrega em sua história diversos episódios de racismo que remetem ainda à primeira metade do século passado, quando atletas negros eram proibidos de jogar no Internacional e Grêmio, o que originou a Liga dos Canelas Pretas, um campeonato paralelo realizado em Porto Alegre. Com o tempo, o time tricolor, até por suas origens, assumiu a postura de equipe dos descendentes de europeus, enquanto o rival colorado virou o time do povo. Apesar de fazer parte do passado, as ofensas persistem nos cânticos, nos quais os torcedores do Inter são chamados de "macacada", além de episódios de racismo dentro e fora dos campos contra jogadores de ambos os times.
Em entrevista durante a apresentação no Bahia, nesta semana, o meia Zé Roberto disse que deixou o Internacional, time com o qual tinha contrato até 2013, porque seu filho foi vítima de racismo na escola. "Eu não gosto nem de falar muito sobre isso. Mexeu muito comigo, com a família. Foi o que mais fez com que eu deixasse o Inter", confessou. Na final do Campeonato Gaúcho de 2011, o jogador foi alvo de outra manifestação racista, quando a torcida gremista imitou o som de macacos ao ouvir o seu nome durante uma substituição.
O meia Tinga também sofreu o mesmo tipo de ataque em 2006, em um jogo do Internacional contra o Juventude, pelo Brasileiro. Cada vez que pegava na bola, a torcida imitava o som de macaco. Hoje, ele prefere não falar mais sobre o episódio. Jogadores gremistas também já foram alvo de racismo. Ainda em 2006, Jeovânio Rocha do Nascimento foi alvo de uma ofensa racista após uma entrada forte do então zagueiro do Juventude Antônio Carlos, que deixou o campo esfregando a mão no braço, referência racista à cor da pele do adversário. Hoje no Santa Cruz, o jogador prefere não falar mais sobre ao assunto.
'Preto filho da p****'
A frase acima foi a ofensa racista ouvida pelo jogador Glauco Simonelli Venancio, quando defendia o Ypiranga de Erechim (RS), após pedir a bola do gandula em uma partida contra o Santa Maria. "Estávamos perdendo o jogo por 3 a 2. Quando eu fui pedi a bola para o gandula, ele não queria dar, daí eu falei pô, me dá rápido, então o preparador de goleiros estava do outro lado da grade daí ele falou: 'preto filho da p***' e me chamou ainda de macaco".
"Não sou eu que vou conseguir acabar com isso, porque sempre vai existir, mas é difícil, porque você está ali, lutando pelo pão de cada dia, para dar um futuro para a sua família. Quando aconteceu isso, minha filha estava presente, e quando chegamos em casa ela veio me perguntar: 'pai, por que você está chorando, o que foi que aconteceu?' Mas naquele momento eu não podia falar. Inclusive, um dia ela chegou para mim e disse: 'pai, por que eu nasci moreninha, então?' Eu respondi que era porque Deus quis assim", lembra.
Apesar da fama, o Grêmio tem na sua Calçada da Fama o ex-jogador e hoje vereador de Porto Alegre Tarcisio Flecha Negra. Ele diz que nunca sofreu nenhum tipo de preconceito: "nunca senti, até hoje, nenhum tipo de preconceito por ser negro". No entanto, admite que a torcida do Grêmio se referir aos colorados como "macacada" extrapola os limites.
"Eu acho que extrapola um pouco, eu não sei... Quando cantam aquilo para o Internacional, o torcedor tem direito, desde que não agrida fisicamente qualquer outra torcida que seja, mas cantar, gritar, botar faixa, todos nós temos direito de reivindicar... Acho que aqui já se está acostumado, os colorados chamam o Olímpico de chiqueiro, e os colorados são chamados de macacada lá (no Beira-Rio)", diz ele, referindo-se ao combate como algo local, que não é muito bem compreendido por outros Estados brasileiros.
Ele diz que quando chegou ao Estado, em 1973, ficou reticente com a história do clube. "Havia a história de que o Grêmio era um time onde não jogavam negros, mas depois vieram o Tesourinha, Juarez, Alcinho e Paulo Lumumba", enumera. Para ele, a restrição estava relacionada à proximidade com a Argentina e Uruguai, além do Rio Grande do Sul ter recebido muitos imigrantes da Polônia, Alemanha e Itália. "Os negros foram para a Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais, se veem poucos aqui. Então na história teve muito racismo, só que hoje eu não vejo muito isso".
Já o advogado, ex-radialista e profundo conhecedor do futebol gaúcho Antonio Carlos Cortes é bastante crítico quando à conotação racista embutida na batalha entre as duas torcidas. Ele afirma ainda que o Rio Grande do Sul é o Estado mais racista do Brasil. "Até recentemente, em grenais realizados no Olímpico, a torcida do Grêmio estendia um faixa dirigida à torcida do Internacional com a inscrição: 'a maior macacada do Rio Grande do Sul'".
Ele lembra ainda o episódio da contratação do centroavante Christian pelo Grêmio. "Ele estava nas sociais do Grêmio com toda a família, amigos, dando autógrafos. Quando o Inter entrou em campo, a torcida do Grêmio começou a imitar macacos, e segundo registro de jornais da época, ele (Christian) foi afundando na cadeira porque dentro de campo tinha o Roger, Tinga, Douglas, todos negros...", conta.
Paulo Cézar Lima, o Caju, atleta que ganhou notoriedade no Botafogo e fez parte da Seleção Brasileira de 1970, relata também o racismo que encontrou no Rio Grande do Sul na década de 60. Ele relata no livro Fala Crioulo, do Aroldo Costa, o seguinte:
"Quando passei a excursionar com o Botafogo comecei a sentir o racismo pelo interior do País. Uma das coisas que mais me chocaram foram as tabuletas que encontramos em bares e restaurantes que encontramos em Bagé, Santana do Livramento e Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, onde dizia: proibida a entrada de negros. Nós éramos cinco ou seis jogadores negros, Jairzinho, Moreira, Leônidas, Zequinha e, para nós, o aviso tinha o efeito de uma punhalada no peito. A gente então imaginava como não deveria ser a vida de crioulo local, marginalizado e humilhado por aquelas tabuletas de m... Aí, só de bronca, entramos no peito e na raça só para ver se acontecia alguma coisa e a gente criava logo um sebo, mas como nós éramos conhecidos, fingiam que não viam a cor da gente'", diz Cortes, ao ler um trecho da publicação.
"O Rio Grande do Sul é o Estado mais racista de todo o Brasil. Isso é evidente. A cada momento ocorrem situações terríveis. Tanto que você não encontra treinadores negros. Tem as exceções, mas exceção confirma a regra. Eu dizia para Escuro (Escurinho, ídolo colorado morto no ano passado) que aquela cabeça que resolvia dentro de campo, que até mudava o que o treinador determinava, não servia para ficar na boca do túnel", afirma.
Ele acusa os dirigentes de serem coniventes com as manifestações racistas das torcidas. "Existe certo fingimento de que não se sabe de nada nas direções dos clubes, porque muitas vezes, com a torcida votando nas eleições dos clubes, os dirigentes não querem se indispor com as torcidas. Ou será que a torcida ao seu bel prazer estende a faixa lá? A direção poderia dizer tira isso daí (...) há setores, torcidas que dizem que tem uma alma castelhana, renegam a alma brasileira. Quando argentino chama o brasileiro de macacada, é no sentido amplo e atinge o brasileiro de um modo geral, porque aqui tem uma maioria negra. Mas o sentido é agressivo e ofensivo dentro desta realidade que existe".

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Marcelo Paixão – O sexo e a cor da desigualdade

Nos últimos anos, ocorreram reduções nas desigualdades raciais em alguns indicadores do mercado de trabalho, como, por exemplo, o rendimento médio do trabalho. Porém, apesar desta queda, os abismos nos indicadores das pessoas brancas e pretas/pardas permanecem muito elevados. Este panorama é atestado pelo boletim “Tempo em Curso”, elaborado pelo Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais (Laeser/UFRJ).
Os dados do boletim (clique aqui para acessar) mostram o já conhecido abismo de rendimento que separa os homens brancos dos negros. E explicita que, além da cor da pele, a distância de rendimento expressa também uma dimensão de gênero: mulheres brancas e negras (pretas e pardas) estão separadas por centenas de reais em termos de rendimento (R$ 1.638 para as primeiras; R$ 906 para as segundas – números registrados em setembro de 2011). A taxa de desemprego, avaliada em cima das seis maiores regiões metropolitanas do país, também indica um cenário pior para as mulheres pretas e pardas, cujo desemprego foi de 9,3% em setembro de 2011, ante 6,2% para as brancas.
O boletim compilou também dados entre 2009 e 2010 que falam sobre a violência contra as mulheres, incluindo sua desagregação de cor ou raça. Esta análise compõe a segunda parte do boletim. As notificações de violência contra mulheres foram feitas segundo os grupos de cor ou raça, a partir dos dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN/Ministério da Saúde). Os números apontam 66.350 casos de violência contra mulheres entre 2009 e 2010: 27.676 tendo as brancas como vítimas e 23.698 tendo as negras como agredidas. Houve 14.176 denúncias cuja declaração de cor não foi registrada.
O economista, sociólogo e coordenador geral do Laeser, Marcelo Paixão, afirma em entrevista ao CLAM como funciona a dinâmica de gênero que marca as desigualdades salariais e reflete sobre os números de violência contra mulheres.
Os dados mostram que as assimetrias de renda não se limitam à divisão homem e mulher. Dentro da população feminina, a diferença de renda entre trabalhadoras brancas e negras/pardas é de 80,7%. O que esses números dizem sobre a relação entre aspectos raciais e de gênero no mercado de trabalho?
O rendimento médio do trabalho das pessoas pretas e pardas é sempre inferior comparado ao dos grupos de pessoas de cor ou raça branca e amarela. O desemprego também é uma variável cronicamente desfavorável aos negros.
O fator educacional pode ser mobilizado para explicar estas diferenças, tendo em vista a menor escolaridade média dos negros em relação aos brancos. Mas não podemos explicar isso apenas pela educação. O próprio mercado de trabalho apresenta uma dinâmica que além de remunerar desigualmente pessoas negras e brancas que ocupam postos parecidos, discrimina as pessoas de pele escura quando da oferta de oportunidades ocupacionais melhor recompensadas financeiramente e de maior prestígio social. Tal realidade por sua vez gera um efeito de muito difícil mensuração, mas que se coloca evidente, qual seja: o fato de existirem poucas pessoas negras nos postos de trabalho de melhor posição reforça a baixa escolaridade deste grupo pela via do rebaixamento da auto-estima. Isso forma um círculo vicioso que alimenta a perpetuação das assimetrias sociais e raciais no país.
Quando associamos o debate acima com a da questão de gênero, o que ocorre é o que chamamos de preconceito e discriminação agravados, que une sexo e cor de pele. Os números oficiais que falam do modo pelo qual o mercado de trabalho brasileiro trata as mulheres negras mostram que as relações raciais e de gênero permeiam nosso mercado de trabalho, penalizando aqueles indivíduos que carregam características desvalorizadas socialmente. Seus patamares de remuneração são invariavelmente inferiores aos dos demais grupos, incluindo as mulheres brancas e os homens negros – grupo ao qual em comparação tem até maior escolaridade. Sua taxa de desemprego e informalidade é também invariavelmente maior que a dos demais grupos. Ou seja, a discriminação por cor e gênero torna mais vulnerável a população feminina e negra.
A sociedade brasileira é atravessada por questões de gênero, raça, classe social, entre tantas outras variáveis. E o mercado de trabalho espelha essa dinâmica de desigualdade.
O rendimento médio das mulheres pretas e pardas subiu de R$ 889,83, em setembro de 2010, para R$ 906,69, em setembro deste ano. O rendimento das mulheres brancas ficou praticamente estável (de R$ 1.640 a R$ 1.638). Podemos falar em um processo contínuo de redução da distância entre essas mulheres? Ou é um dado pontual?
Ao longo dos últimos anos o mercado de trabalho brasileiro caminhou no sentido da redução das desigualdades sociais e raciais. De um lado o controle da inflação permitiu a preservação do poder de compra dos salários e remuneração do trabalho dos trabalhadores mais pobres. Por outro lado, ocorreu uma política de valorização do salário mínimo, após aumentos reais sucessivos estipulados pelo governo federal. Atualmente salário mínimo brasileiro superou os U$ 200, algo inconcebível há dez anos atrás. Isso repercute no setor formal e no informal, que se referencia no piso salarial. No mesmo rumo, tal movimento contribuiu para a redução das assimetrias.
Porém, é preciso perceber que tal movimento também espelha fenômenos não necessariamente positivos ocorridos nos últimos anos. Desde 1995, com a instituição do plano real, nossa economia ficou mais exposta à competição estrangeira, problema que se agravou não somente pela abertura comercial, mas também pela política de juros elevados e a valorização cambial. Com isso os escalões superiores das ocupações profissionais perceberam ou uma estagnação ou mesmo queda nos seus rendimentos. Este grupo é usualmente formado por pessoas brancas, especialmente do gênero masculino. Por um lado, não haveria motivos para se lamentar este movimento. Mas, por outro, talvez o ideal fosse que as desigualdades sociais e raciais se encurtassem num contexto de aumento geral dos patamares de remuneração da população trabalhadora, inclusive de seus escalões melhor remunerados.
De qualquer maneira, com a reestruturação econômica recente, o leque salarial encolheu, favorecendo a redução das desigualdades raciais, inclusive quando se analisa especificamente a população do sexo feminino desagregada pelos grupos de cor ou raça.
Finalmente, cabe mencionar que se o rendimento dos postos mais altos encolheu e o dos escalões mais humildes subiu, a forma de acesso ao mercado de trabalho por parte dos diferentes grupos de cor ou raça fundamentalmente não mudou. A população branca era 80% dos empregadores nos anos 1990, percentual que se mantém atualmente. Os homens negros e as mulheres negras, respectivamente, costumam responder por cerca de 65% – 70% dos empregos na construção civil e doméstica, isso tanto antes como depois das transformações ocorridas em nosso mercado de trabalho.
Sinteticamente, portanto, pode-se dizer que houve uma mudança nos patamares de rendimento dos grupos de cor ou raça, mas sem mudar essencialmente o modo pelo qual os distintos contingentes chegam ao mercado de trabalho. Assim, segue existindo maior probabilidade de uma pessoa de pele clara ter acesso aos postos mais prestigiados, o contrário ocorrendo com as pessoas de pele escura.
Entre 2009 e 2010, foram registradas 66.350 denúncias de violência contra mulheres, das quais 27.676 contra brancas e 23.698 contra pretas e pardas. A que podemos atribuir essa diferença de denúncias?
Em primeiro lugar, acho importante destacar que o Ministério da Saúde tenha passado a coletar estes dados. Incorporar os dados da violência contra a mulher dentro do SINAN, pois além de dar visibilidade ao tema, é, igualmente, um reconhecimento de que o problema não é uma questão meramente policial, é também um problema social gravíssimo, uma questão de saúde pública.
A superioridade das denúncias de mulheres brancas deve abrigar duas observações preliminares. A primeira é que, pelos dados do SINAN, há 14.176 casos de violência contra a mulher sem o registro da cor da pele da vítima, o que diante do estudo dos impactos deste fenômeno sobre os grupos de cor ou raça corresponde a uma significativa subnotificação. Ou seja, esta lacuna prejudica uma análise mais profunda do fenômeno da violência de gênero sobre os grupos de cor ou raça.
Apesar de os números não serem auto-evidentes, uma segunda hipótese que podemos inferir é que as mulheres brancas, pelo maior nível de formação, melhores condições socioeconômicas e maior auto-estima, se sentiriam mais seguras de seus direitos e denunciariam com mais facilidade as violências sofridas às autoridades da área da saúde. As negras, diante da desvalorização social crônica a que são submetidas, poderiam ter hipoteticamente maiores dificuldade na hora de reclamar e defender seus direitos por não se sentirem seguras para tanto. Os dados não dizem isso, mas dialogam com nossa realidade social tornando a hipótese plausível. Assim, os dados da violência que incidem contra as mulheres negras poderiam estar ainda mais subestimados.
Um dado que chama a atenção é a maior incidência de violências sexuais contra as mulheres negras (45% contra 40%). O estupro, por exemplo, registrou o índice de 48,6% para negras contra 38,8 para brancas. A que fatores podemos atribuir essa realidade?
É difícil responder precisamente a esta pergunta na falta de dados complementares, muito embora não seja nada implausível associar tais diferenças ao padrão brasileiro de relações raciais e à forma pela qual as mulheres negras são usualmente tratadas em nossa sociedade. O fato das mulheres viverem em ambientes socioeconomicamente mais precários e pobres deve influenciar esses números. Mas a cor da pele é em si um fator que aumenta a exposição à violência, especialmente a sexual, situação na qual se soma o desrespeito com a falta de consideração para com a dignidade humana. O que os números do SINAN sugerem é que o racismo atua como um mecanismo que potencializa a vulnerabilidade das mulheres negras para este tipo de situação.
Que tipos de ações, leis e políticas públicas podem ser criadas ou melhoradas para combater essas desigualdades no âmbito trabalhista e da violência?
O enfrentamento das desigualdades no mercado de trabalho envolve desde o investimento na educação, para proporcionar uma formação técnica e profissional, até políticas de ação afirmativa no setor público e privado. A redução das desigualdades raciais precisa ser vista como um objeto a ser perseguido pelo Estado e por toda sociedade. Infelizmente, isso não acontece no mercado de trabalho e demais espaços da vida social, contribuindo para que as posições desvantajosas das pessoas negras na sociedade brasileira se prorroguem indefinidamente.
A questão da violência contra a mulher é mais complexa. Não é apenas uma questão econômica ou de prestígio social. O agente violador dos direitos da mulher pode ser encontrado em todas as classes sociais e grupos de cor ou raça. O racismo à brasileira impulsiona este tipo de prática, tornando as mulheres negras especialmente vulneráveis, especialmente no plano da violência sexual.
Precisamos, primeiramente, melhorar a produção de dados nas áreas de saúde, educação e segurança e analisá-los conjuntamente. Assim, vamos conseguir pensar melhor o fenômeno da violência contra mulher sob a ótica da saúde pública. E isso vai se refletir nas respostas que o poder público irá elaborar. Mas estas respostas terão de englobar diversos níveis, incluindo o plano educacional, da área da saúde e da segurança pública. E também das políticas da igualdade racial, que igualmente deveriam permear este conjunto de áreas desde uma perspectiva transversal.
Fonte:
http://www.geledes.org.br/areas-de-atuacao/questao-racial/afrobrasileiros-e-suas-lutas/12614-marcelo-paixao-o-sexo-e-a-cor-da-desigualdade

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Manifestação em frente a restaurante de SP pede fim do racismo no país

Rede Brasil Atual – Últimas Notícias

Por: Elaine Patricia Cruz

São Paulo – Enquanto algumas pessoas almoçavam no Restaurante Nonno Paolo, na zona sul de São Paulo, do lado de fora, um pequeno número de pessoas fazia um panelaço contra atitudes racistas. A manifestação, pacífica, foi organizada pela internet e motivada pela história do casal espanhol que teve o filho adotivo, de 6 anos, retirado do estabelecimento.
Enquanto os pais se serviam no restaurante, o filho etíope ficou esperando em uma das mesas. Um dos funcionários da pizzaria abordou a criança e a retirou do local. O casal espanhol encontrou o filho na calçada e registrou um boletim de ocorrência por discriminação racial na Delegacia do bairro de Vila Mariana.
A estudante Carina Paola Cardenas, uma das idealizadoras do protesto, disse que o objetivo é chamar a atenção para o preconceito racial. “Pretendemos mostrar às pessoas que o racismo existe. Não se consegue mudá-lo somente por leis. O que muda isso é a conscientização. Por isso, estamos estimulando o boicote aos estabelecimentos que tenham esse tipo de política de maltratar pessoas seja por causa da raça ou por questão social.”
Wilson Honório da Silva, do Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe, disse que o protesto, apesar de ter contado hoje com um grupo muito pequeno de pessoas, não pode ser esgotado. “O movimento tem o propósito de mandar um recado para a sociedade. Estamos cansados de viver em um país onde ser negro é parecer marginal.”
Para ele, a ideia é organizar manifestações ao longo do ano para alertar a população sobre o racismo. “Estamos propondo transformar o dia 21 de março, que é o Dia Internacional de Combate ao Racismo, num grande ato em protesto a todos esses casos que têm se repetido em São Paulo”, disse.
À Agência Brasil, os sócios do restaurante disseram que não iriam se manifestar sobre o caso até a conclusão do inquérito policial.
Na última quarta-feira (4), a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania de São Paulo instaurou um processo para apurar o caso. Se for comprovada a discriminação racial contra a criança, o estabelecimento poderá ser multado.

sábado, 7 de janeiro de 2012

Primeiro aluno de Medicina a entrar por cotas na Ufba recebe diploma

6/01/2012 por Da Redação - Palmares
Em uma casa azul na Ladeira Manoel Faustino – mesmo nome de um dos líderes negros da Revolta dos Alfaiates, que em 2011 se tornou Herói da Pátria – Ícaro Luis Vidal, 24 anos, se apronta para o grande dia de sua vida. À noite, o primeiro estudante a ingressar pelo sistema de cotas no curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia (Ufba) se forma.
As trancinhas que a cabeleireira faz em seu black power têm dois motivos: um é poder vestir o capelo de formatura (chapéu usado na solenidade). O outro é a pressão de sua mãe, Raimunda Vidal dos Santos, 47, que acha que assim o filho fica mais bonito para a festa, realizada ontem à noite, no Centro de Convenções.
Ícaro começou o curso em 2005, quando a Ufba implantou o sistema de cotas. Hoje, a instituição reserva 2% das vagas para índio-descendentes e 43% para alunos que tenham todo o ensino médio em escolas públicas. Desses, 85% são para estudantes que se declararam pardos ou pretos.
Ao fim do 3º ano no Colégio da Polícia Militar, conciliado com o cursinho, Ícaro já tinha passado no meio do ano em Direito na Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs). “Assim, eu fiz a prova mais tranquilo”. Amiga de infância, Inês Costal, 24, lembra dele como aluno aplicado. “Sempre foi brilhante, era o CDF”, relata.
Orgulho
Ícaro atribui o desempenho à sua criação. “Ele nunca me deu trabalho, mas sempre cobrei. A média do colégio era 8, mas eu exigia 9”, lembra a mãe. O rigor deu resultado. “Tenho orgulho dos meus filhos”, afirma ela, incluindo a filha Ísis Carine dos Santos, 25, que mês que vem se forma em Engenharia Química, também na Ufba.
Ontem, na formatura, dona Raimunda via o sonho realizado e vibrava num longo rosa. “Dever cumprido. Agora vou cuidar de mim”, diz ela, que este ano vai tentar cursar Pedagogia. “Espero conseguir uma vaga pelo Enem”, torce.
Ícaro divide com ela e com Ísis uma casa na Liberdade. O pai, que mora em Feira de Santana, também veio para a formatura. Uma outra irmã mora em Conceição de Feira.

Desafios

O sonho de Medicina surgiu cedo. Ao ver crescer a barriga de três tias que engravidaram na mesma época, a cabeça do menino de 6 anos se encheu de perguntas. “Queria saber como tinha entrado, como saía”, lembra. Com o tempo, esqueceu a obstetrícia: agora quer ser oncologista. “Conviver com esses pacientes, tão carentes de atenção, me despertou para a área. O câncer é uma doença que isola”, reflete.
Se os pacientes sofrem, Ícaro também passou perrengues. Nos dois primeiros anos, além de cursar a faculdade, trabalhava e fazia curso técnico em Química, no Instituto Federal da Bahia (Ifba, então Cefet), que lhe possibilitou ser perito técnico da Polícia Civil.
O rapaz só chegava em casa às 23h e ainda tinha que estudar até as 2h. Várias vezes acabou dormindo em cima dos livros. “Mas nunca repeti nenhuma matéria”, orgulha-se.
O grande impacto na Ufba foi o grau de dificuldade. “A cota facilita a entrada, mas sair depende de você”, analisa.
Hoje, Dr. Ícaro está encaminhado: passou em um concurso para médico do Programa Saúde da Família (PSF). E quer mais. “Quando vi a equipe do (Hospital) Sírio-Libanês que cuidou de Lula falando com os repórteres, pensei: um dia eu é que vou estar aí”.
Projeto propõe cotas obrigatórias.
Mesmo com tantas universidades no país adotando cotas, não há uma lei federal que determine regras ou obrigue as instituições a aderirem ao sistema. As universidades têm autonomia para decidir quantas vagas destinarão às cotas e se o critério será socioeconômico ou étnico. Um Projeto de Lei (71/99) sobre o tema já foi aprovado na Câmara e desde 2008 aguarda para ser votado no Senado. Segundo a proposta, apresentada em 1999 pela então deputada federal Nice Lobão (PFL-MA), as universidades públicas federais reservariam vagas para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, tenham renda familiar per capita de até 1,5 salário mínimo e sejam negros, pardos ou indígenas.
No Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Ricardo Lewandowski relata duas ações contra cotas para negros. A primeira foi ajuizada pelo DEM contra a Universidade Federal de Brasília (UnB), onde uma comissão decide por foto ou entrevista quem pode ser classificado como negro, pardo ou branco. A outra foi proposta em maio por um estudante que não foi aprovado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Há ainda no STF mais três ações sobre o sistema de cotas adotado pelo ProUni. Os processos estão na pauta de votação desse ano.

Racismo no restaurante Nono Paollo abre feridas e deixa profundas lições

Por Sueli Carneiro

O menino negro era o único “ponto escuro” entre os clientes do restaurante e para esse “ponto escuro” há lugares socialmente predeterminados dos quais restaurantes de áreas consideradas “nobres” da cidade de São Paulo estão excluídos.
Há coisas essenciais sobre o racismo no episódio ocorrido no restaurante Nonno Paolo com um menino negro.
Eu não estava lá, mas pela reação de indignação da mãe da criança e seus amigos é lícito supor que a criança em questão, seja amada e bem cuidada, portanto, não estava suja e maltrapilha como costumam estar as crianças de rua que encontramos cotidianamente na cidade de São Paulo.
Então, a “confusão” de quem a tomou, em princípio, por mais uma criança pedinte se deveu ao único traço com o qual a define a mentalidade racista: a sua negritude. Presumivelmente, o menino negro era o único “ponto escuro” entre os clientes do restaurante e, para esse “ponto escuro”, há lugares socialmente predeterminados dos quais restaurantes de áreas consideradas “nobres” da cidade de São Paulo estão excluídos.
Para o racista, a negritude chega sempre na frente dos signos de prestígio social. Por isso, Januário Alves de Santana foi brutalmente espancado por não ser admissível para os seguranças do supermercado Carrefour que ele fosse proprietário de um Ecosport, dentro do qual se encontrava no estacionamento a espera de sua mulher que realizava compras. Por isso, a cantora Thalma de Freitas foi arbitrariamente revistada e levada em camburão para uma delegacia por ser considerada suspeita enquanto, como ela disse na ocasião, “porque a loura que estava sendo revistada antes de mim não veio para cá?”. Por isso, Seu Jorge, além de múltiplas humilhações sofridas na Itália, foi impedido, em dia de frio europeu, de entrar em uma loja com o carrinho no qual estava a sua filha, “confundido” como um monte de lixo. São apenas alguns exemplos de uma lista interminável de situações em que são endereçadas para pessoas negras mensagens que têm um duplo sentido: reiterar o lugar social subalterno da negritude, bem como desencorajar os negros a ousarem sair dos lugares que, desde a abolição, lhes foi destinado: as sarjetas do país.
O episódio indica, portanto, que uma criança, em sendo negra e, por consequência “natural” , pobre e pedinte, pode “legitimamente” ser atirada à rua, sem cerimônia. É, devolvê-la ao seu devido lugar. Indica, ademais, que essa criança não desperta o sentimento de proteção (que devemos a qualquer criança) em relação aos perigos das ruas, pois ela é, para eles, uma das representações do que torna as ruas um perigo!
Essa criança, por ser negra, também não é abrigada pela compaixão, pois há quem vê nelas a “semente do mal”, como o fez certa vez, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, defendendo a descriminalização do aborto para mulheres faveladas, pois seus úteros seriam “fábricas de marginais.”
Há os que defendem a atitude do funcionário que expulsou a criança do restaurante sob o argumento de a que região em que ele está localizado costuma ser assediada por crianças pedintes que aborrecem a clientela dos estabelecimentos comerciais. Na ausência do poder público para dar destino digno a essas crianças, cada um age de acordo com sua consciência, via de regra, expulsando-as. Outros dizem que a culpa pelo ocorrido é dos pais, que deixaram a criança sozinha na mesa. O subtexto desse discurso é revelador e “pedagógico”: pais de crianças negras deveriam saber que elas podem ser expulsas de restaurantes enquanto eles se servem, porque elas são consideradas pedintes, ou menor infrator! O erro não estaria no rótulo ou estigma e, sim, nos desavisados que não compreendem esse código social perverso!
Os que assim pensam pertencem à mesma tribo de indignados que consideram que espaços até então privativos de classes sociais mais abastadas começam a serem tomados de “assalto” por uma gente “diferenciada”, fazendo aeroportos parecerem rodoviárias ou praças de alimentação. Aqueles que não se sentem incomodados com a desigualdade e a injustiça social. Aqueles que reclamam que agora “tudo é racismo” porque, para eles, o politicamente correto é dizer que nada é racismo.
Esses são, enfim, aqueles que condenam o Estatuto da Criança e do Adolescente, que advogam pela redução da maioridade penal, que revogariam, se pudessem, o inciso constitucional que define o racismo como crime inafiançável e imprescritível, ou a lei Caó que tipifica e estabelece as penalidades por atos de discriminação; conquistas da cidadania brasileira engendradas por aqueles que recusam as falácias de igualdade de direitos e oportunidades em nosso país.
O aumento da inclusão social ocorrida nos últimos anos está produzindo deslocamentos numa ordem social naturalizada na qual cada um “sabia o seu lugar” , o fundamento de nossa “democracia racial”. O desconforto que esse deslocamento provoca faz com que os atos de racismo estejam se tornando cada vez mais frequentes e virulentos.
Atenção gente negra! Eles mudaram! O mito da democracia racial está revelando, sem pejo, a sua verdadeira face. Então, é hora de se conceber e empreender novas estratégias de luta!
http://www.pragmatismopolitico.com.br/2012/01/racismo-no-restaurante-nono-paollo-abre.html

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

O negro no Brasil e no mundo: Retrospectiva 2011

O Brasil e o mundo foram marcados no ano de 2011 por importantes fatos relacionados a população negra. O primeiro de uma promissora década que tem como perspectiva interesses coletivos em torno da justiça social, do resgate de valores morais, da liberdade, igualdade e, principalmente da fraternidade.
Para que estes objetivos ganhassem visibilidade a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu 2011 como Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes tornando-o ano de reflexão sobre as conseqüências do racismo e da intolerância. Um marco para a população negra em suas especificidades, mas que trouxe também à tona debates, relacionados a outros interesses, grupos e gêneros no sentido da pacificação mundial.
Apesar de conquistas importantes, notícias e estudos mais aprofundados mostraram a real situação dos negros na sociedade, um cenário ainda marcado por vulnerabilidades sócio-econômicas e principalmente pelo racismo. Para relembrar os principais momentos deste histórico ano, a Assessoria de Comunicação da Fundação Cultural Palmares apresenta a Retrospectiva 2011 com as principais notícias voltadas aos interesses negros:
Janeiro
• ONU institui 2011 como Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes

Fevereiro
• Incêndio destrói Museu do Carnaval e Cidade do Samba no Rio de Janeiro

Março
• Eloi Ferreira de Araujo é nomeado presidente da Fundação Cultural Palmares

• Dilma Rousseff recebe visita do primeiro presidente negro dos Estados Unidos: Barack Obama

• Líderes da Revolta de Búzios são reconhecidos como heróis nacionais

• É lançada frente parlamentar em defesa dos direitos quilombolas

• Representação alagoana da Fundação Cultural Palmares comemora seu primeiro ano

• Comissão de Direitos Humanos do Senado discute Estatuto da Igualdade Racial

Abril
• Plano de Cultura do Distrito Federal estabelece metas para afro-brasileiros

• Caso Bolsonaro: Palmares encaminha denúncia de racismo à Procuradoria Geral da República

• Clube de Regatas Vasco da Gama adota medidas anti-racismo

• Rainha do samba, Dona Ivone Lara celebra 90 anos

• “Fiscais da cidadania” intensificam o combate a atos de discriminação na internet

• É encontrado o Cais do Valongo no Rio de Janeiro, maior porto de chegada de escravos do mundo
• África do Sul se integra ao grupo de países emergentes – Brasil, Rússia, Índia e China (BRICs)

Maio
• 13 de maio: Presidente da Palmares é condecorado com a Medalha do Mérito Cívico Afro-Brasileiro

• Cadastro Nacional de Adoção revela: crianças negras têm menor chance de adoção nos abrigos brasileiros

• 25 de maio: Dia da África é celebrado no Brasil e no mundo

• Morre Abdias Nascimento, pioneiro na militância contra o racismo no Brasil

Junho
• Pesquisa mapeia casos de intolerância religiosa ocorridos no Brasil

• Decreto cria cotas em concursos públicos no Rio de Janeiro

• Palmares certifica 22 comunidades quilombolas no Maranhão

• 10 anos de morte do Geógrafo Milton Santos

• Somália enfrenta maior seca dos últimos 60 anos

Julho
• Rio de Janeiro anuncia construção de museu em homenagem a João Cândido

• Mundo comemora 93 anos de Nelson Mandela

• 1° ano do Estatuto da Igualdade Racial

• Sudão do Sul se torna o mais novo país do mundo

Agosto
• Dia Estadual do Jongo é oficializado no Rio de Janeiro

• Sobe proporção de negros nas universidades federais

• IPEA revela que mulheres e negros têm menos acesso a transplantes de órgãos

• Aumenta representatividade negra no Congresso Nacional

• Conaq lança Campanha Nacional em Defesa dos Direitos Quilombolas

• É criado Observatório de Prevenção e Repressão ao Racismo e à Exploração Sexual que atuará durante a Copa de 2014

• Comprovado perfil da classe média brasileira: feminina, negra, jovem e conectada

• Relatório aponta que miséria condena mais de 5 milhões de crianças negras no Brasil

• Abdias Nascimento é homenageado com Troféu Palmares

• Imagem social do negro melhora no livro didático

• Militantes negros exigem que fim do racismo faça parte dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio estabelecidos ONU
• Governo, organizações e quilombolas se unem em defesa do Decreto n°4887/2003

• Fundação Cultural Palmares é homenageada por seus 23 anos na Câmara Municipal de São Paulo

Setembro
• Fundo Africano para emergências de saúde pública é aprovado por 45 países

• Frente Negra Brasileira completa 80 anos

• Dez anos da Lei de Cotas no Brasil

• Presidenta Dilma Rousseff assina decreto que beneficia 500 quilombolas de Minas Gerais

Outubro
• OAB/SP lança campanha contra racismo no ambiente corporativo

• As liberianas Ellen Johnson Sirleaf e Leymah Gbowee recebem Prêmio Nobel da Paz

• Martin Luther King ganha monumento em Washington

• Dilma Rousseff estreita cooperação com países africanos

• Fundação Cultural Palmares realiza Exposição Expressões Africanas para celebrar povos afrodescendentes

• Realizado em Salvador primeiro casamento civil em um terreiro de candomblé

Novembro
• Dilma Rousseff sanciona dia 20 como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra

• Homenagens a Zumbi marcam 20 de novembro na Serra da Barriga

• Salvador é decretada Capital Negra da América Latina

• Governo e religiosos lançam Comitê Nacional de Diversidade Religiosa

Dezembro
• Tombado ofício da Baiana do Acarajé

• Luislinda de Valois Santos se torna primeira desembargadora negra do país

• Presidente da Fundação Cultural Palmares recebe título de honra do Ministério da Defesa

• Justiça e Igualdade Racial é tema do Prêmio Direitos Humanos 2011

• Ato Nacional Contra o Extermínio da População Negra marca conferência em Brasília

• Fundação Cultural Palmares recebe Comenda Zumbi dos Palmares

• Morte de negros por homicídio sobe 23,4% em oito anos

• Inaugurada biblioteca em homenagem a Oliveira Silveira

• Mapeados os terreiros de quatro estados do país

• 26 anos da Lei Caó

Palmares

Uma homenagem a Oliveira da Silveira

Biblioteca da Fundação Cultural Palmares presta um tributo ao revolucionário poeta negro e lança a coleção Faces do Brasil – História e Cultura, escrita por negros e indígenas
CAROLINY RODRIGUES
Autores de vários estados prestigiaram a cerimônia de lançamento da coleção Faces do Brasil na Fundação Cultural PalmaresOs brasilienses ganharam mais uma espaço destinado à leitura e à cultura afrodescendente. A Fundação Cultural Palmares (FCP), instituição pública vinculada ao Ministério da Cultura que tem a finalidade de promover e preservar a cultura afro-brasileira, inaugurou no mês de dezembro a biblioteca Oliveira Silveira, em homenagem ao professor, poeta e militante do movimento negro.
Naiara Rodrigues Silveira, única filha do poeta, não pôde comparecer ao evento, porém enviou uma carta de agradecimento na qual diz: “Dar o nome desse poeta da consciência negra a um lugar como esse é perpetuar seu trabalho na lembrança da nossa negritude”, escreveu.
Instalada na sede da Fundação Cultural Palmares, no Setor Comercial Sul, no coração de Brasília, a biblioteca tem um acervo de mais de 17 mil itens sobre a memória documental da ancestralidade africana. Entre eles, livros, folhetos, periódicos, artes plásticas e peças produzidas em quilombos. Além disso, o local disponibiliza para os visitantes uma sala de vídeo com capacidade para 16 pessoas e terminais de acesso à internet. “Em nossa história sempre fomos excluídos e termos um espaço voltado para as obras escritas por nós é de extrema importância. Estamos em festa”, comentou a professora e militante Jacy Proença.
Os interessados nas obras sob a guarda da Fundação Cultural Palmares podem conferir a listagem do acervo bibliográfico no site http://biblioteca.palmares.gov.br . Aos que preferem conhecer a biblioteca, o atendimento ao público, para consultas locais, é feito de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h.
Livros sob a ótica afrodescendente
Na mesma cerimônia foi lançada, em comemoração ao ano dos afrodescendentes no país, a coleção Faces do Brasil – História e Cultura. Os 42 livros, publicados pela Editora Ética, foram escritos por negros e indígenas de 13 estados brasileiros e do Distrito Federal e organizados pela professora Jacy Proença, ativista do movimento negro.
“As obras são destinadas aos alunos dos ensinos fundamental e médio. É uma coleção consagrada da editora e já está disponível em mais de dez estados, além de estar aprovada em outros lugares também”, contou a professora Jacy. Ela considerou o evento como a realização de um sonho. “Era apenas uma aspiração e lutamos por ela até concretizarmos. A festa de lançamento foi prova disso”.
Ao som de canções de Nelson Cavaquinho e Dona Ivone Lara, interpretadas pela cantora Cris Pereira, o público de aproximadamente 150 pessoas – entre as quais representantes do movimento negro, das religiões de matriz africana, do governo, quilombolas e embaixadores dos países africanos Guiné Bissau, Etiópia, Benin e Burquina Faso, dentre outros – pôde ouvir o depoimento de alguns autores e relembrar a importância do poeta Oliveira Silveira, um gaúcho revolucionário que lutou pela igualdade racial, além de ter sido o idealizador do dia 20 de novembro (dia da consciência negra).
“Foi uma honra escrever uma obra para essa coleção, pois sabemos da importância de destacar a nossa cultura e lutar por ela”, afirmou Ceiça Ferreira, autora do livro Laroiê! Representações do candomblé e da umbanda no cinema brasileiro. Ela finalizou o discurso citando um provérbio africano que diz: “Até que os leões tenham seus próprios historiadores, as histórias de caça continuarão glorificando o caçador”. A professora Jacy complementou. “Foi muito gratificante reunir tantas pessoas em um lugar como a Fundação Palmares e lançar uma coleção com a ótica dos povos negro e indígena. Reconhecemos a relevância de termos uma editora que apoia nossa causa”, emocionou-se.
A Editora Ética do Brasil é reconhecida por promover a diversidade cultural, além de ser pioneira na construção de coleções didáticas sobre a valorização humana do afrodescendente. “Não estamos apenas ampliando o número de títulos da editora. Acredito que estamos, sim, fazendo parte de um momento revolucionário da história do país. Uma revolução social, que passa pela educação, e a nossa empresa, junto com os autores e colaboradores, estão plenamente inseridas nele”, ressaltou Ângelo Carvalho, diretor-comercial da editora.
Carlos Moura, coordenador geral do Centro Nacional de Informação e Referência da Cultura Negra (CNIRC) e primeiro presidente da FCP, finalizou a cerimônia recitando trechos do poema Encontrei minhas origens, do poeta Oliveira Silveira

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