domingo, 19 de outubro de 2014

GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA: PREVALÊNCIA DE DEPRESSÃO, ANSIEDADE E IDEAÇÃO SUICIDA

Esse importante trabalho vem de encontro às preocupações que o MNU tem com a crescente onda de casos de gravidez na adolescência que atinge as meninas negras, pobres e sem o devida informação. Espero que tenham uma boa leitura. GISLEINE VAZ SCAVACINI DE FREITAS*, NEURY JOSÉ BOTEGA Trabalho realizado no Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas Universidade Estadual de Campinas, SP RESUMO  OBJETIVO: Determinar a prevalência de depressão, ansiedade e ideação suicida em adolescentes grávidas e verificar associações entre ideação suicida e variáveis psicossociais. MÉTODOS: A amostra foi composta por 120 adolescentes grávidas (40 de cada trimestre gestacional), de 14-18 anos, atendidas em um serviço público de pré-natal. Utilizaram-se a Entrevista Clínica Estruturada-edição revisada (CIS-R), a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HAD) e a Escala de Ideação Suicida de Beck. A análise estatística utilizou os testes do Qui-quadrado, de Fisher e o teste U de Mann-Whitney. RESULTADOS: Foram encontrados 28 (23,3%) casos de ansiedade, 25 (20,8%) de depressão e 19 (16,7%) de ideação suicida. Não houve diferenças nesses quadros nos trimestres gestacionais. Tentativa de suicídio anterior à gravidez foi relatada por 16 (13,3%) adolescentes. A ideação suicida associou-se com depressão (p = 0,001), ser solteira sem namorado (p = 0,01) e contar com pouco apoio social (p = 0,001). Os casos de ideação suicida apresentaram alta freqüência de falta de concentração, ansiedade, depressão, preocupações, obsessões, idéias depressivas, fadiga, preocupações com o funcionamento do corpo e compulsões. As idéias depressivas foram o sintoma comum para os casos de depressão, de ansiedade, de ideação suicida e de tentativa de suicídio anterior. CONCLUSÕES: O grupo apresentou-se heterogêneo quanto à saúde mental. No entanto, diante da freqüência com que se observam quadros de depressão, ansiedade e ideação suicida em adolescentes, recomenda-se aos profissionais de saúde atenção para detectar a presença de idéias depressivas em adolescentes grávidas. UNITERMOS: Adolescência. Gravidez. Tentativa de suicídio. Depressão. Ansiedade. INTRODUÇÃO A gravidez é a primeira causa de internações (66%) em moças com idade entre 10 e 19 anos na rede SUS. Aproximadamente um quarto do total de partos são em adolescentes de 10 a 19 anos. A segunda causa de internações nessa mesma população corresponde ao grupo de causas externas, entre as quais, a tentativa de suicídio1. Cassorla2, ao realizar em Campinas um estudo clínico-epidemiológico do tipo caso-controle, incluindo 50 casos de tentativa de suicídio em jovens entre 12 e 27 anos, observou que um terço dessas haviam estado grávidas. Sugere que a gravidez seria apenas um evento em uma carreira de vários outros eventos interligados que levariam uma jovem a tentar o suicídio. Essa possibilidade foi reforçada pelos achados de Wagner et al.3 em estudo de caso-controle, envolvendo 1050 escolares com idade entre 12 e 18 anos: no grupo de jovens que haviam tentado suicídio houve relatos de maior atividade sexual, mais namoros, mais parceiros sexuais e gravidezes. A gravidez na adolescência associa-se a um risco suicida elevado, tanto durante a gestação, quanto no pós-parto, paralelamente a uma maior incidência de depressão e a uma percepção negativa da rede de apoio social4. Além disso, são freqüentes os registros de abusos físico e sexual nessa população5, o que se associa com a presença de ideação suicida6, com tentativas de suicídio e com sintomatologia depressiva crônica no primeiro ano após o parto7. Há necessidade de se conhecer melhor como as variáveis acima associam-se nesse contingente populacional, por exemplo: adolescentes grávidas estariam especialmente mais propensas à depressão e à ideação suicida? Esta última, quando presente, estaria associada a quais eventos ou características da história pessoal e das condições de vida dessas jovens? Poucos estudos foram delineados para responder essas questões, e nenhum em nosso meio. O presente estudo teve os objetivos de determinar a prevalência de depressão, ansiedade e ideação suicida em adolescentes grávidas, nos três trimestres da gestação; e de verificar possíveis associações entre ideação suicida e depressão, ansiedade, história de abuso sexual, de agressão física, de tentativa de suicídio anterior, intenção de engravidar, período gestacional, situação conjugal e apoio social. MÉTODOS Trata-se de um inquérito, do tipo transversal, incluindo avaliação clínica, realizado em adolescentes que se encontravam em diferentes períodos gestacionais. Local e Sujeitos Este estudo foi realizado no Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM 2) de Piracicaba, SP. Este programa atende, pelo SUS, todas as grávidas adolescentes do município. Participaram deste estudo 120 adolescentes grávidas (40 no primeiro trimestre gestacional, 40 no segundo e 40 no terceiro trimestre) selecionadas por meio de uma lista de números aleatórios, entre as 329 atendidas no serviço entre outubro de 1999 e fevereiro de 2000. Os critérios de inclusão foram: 14-18 anos de idade, sem filhos, mínimo de cinco anos de escolaridade. Houve apenas uma recusa de participação. Instrumentos A avaliação das adolescentes foi feita de acordo com um protocolo científico específico, altamente estruturado, tendo sido algo paralelo à rotina do atendimento clínico que era oferecido pelo serviço de saúde. A fim de reduzir a subjetividade da avaliação e de aumentar a confiabilidade dos resultados, foram utilizados instrumentos de pesquisa epidemiológica já validados em nosso país: ? Questionário para orientar a anamnese, derivado do "European Parasuicide Standardized Interview Schedule"8, contendo as seguintes seções: dados sociodemográficos, história obstétrica, vida em família e rede de apoio social. A rede de apoio social inclui seis questões, com pontuação final variando de 0 a 6, sobre o apoio que o indivíduo sente que recebe da família, dos amigos, do(a) companheiro(a), sobre religiosidade, facilidade para fazer amigos e o sentimento de ser importante para alguém. ? Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HAD), instrumento de auto- preenchimento, com 14 questões de tipo múltipla escolha. Compõe-se de duas sub-escalas (pontuação de 0 a 21), uma para ansiedade, outra para depressão. A HAD foi desenvolvida para ser aplicada a pacientes de serviços não-psiquiátricos de hospital geral ou da atenção primária9, já tendo sido validada em nosso meio10. ? Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI), de auto-preenchimento, contendo 21 itens11. A gravidade da ideação suicida é calculada somando os pontos dos primeiros 19 itens. Em nosso meio foi validada por Cunha et al(1997)12. ? Entrevista Clínica Estruturada - edição revisada (CIS-R), que avalia transtornos psiquiátricos não-psicóticos (minor psychiatric disorders). Consta de 14 seções: sintomas somáticos, fadiga, concentração, alterações no sono, irritabilidade, preocupações com o funcionamento corporal, depressão, idéias depressivas, preocupações, ansiedade, fobias, pânico, compulsões e obsessões. A freqüência, a intensidade, a persistência e o grau de incômodo ocasionado pelo sintoma são avaliados13. Ao final, a CIS-R solicita que o investigador estime a gravidade do quadro clínico, o que foi feito separadamente para ansiedade e depressão (0 = ausência de sintomas; 1 = sintomas sub-clínicos; 2 = sintomas leves; 3 = moderados; 4 = graves). Esse instrumento apresentou boa aplicabilidade em um estudo realizado em nosso país14. Procedimento As adolescentes foram abordadas na sala de espera e conduzidas a uma sala separada onde eram explicados os objetivos, a questão do sigilo, e a não obrigatoriedade da participação. As que consentiam, assinavam o termo de consentimento. Quando os pais ou responsáveis não estavam presentes, as autorizações de participação eram entregues para a paciente levar ao responsável para assinar e eram devolvidas na próxima consulta obstétrica. No caso da constatação de transtorno mental significativo, ou de risco de suicídio, a adolescente era encaminhada ao serviço de saúde mental. Análise dos dados Pontuação maior ou igual a 12 nas 14 seções da CIS-R definiram um "caso" de morbidade psiquiátrica, cuja gravidade, na prática, exigiria alguma atenção específica de parte do profissional13,14. A determinação de "casos" de ansiedade/depressão deu-se sempre que os três critérios seguintes fossem preenchidos: (a) pontuação igual ou superior a dois na seção "ansiedade" da CIS-R (no caso de depressão, pontuação igual ou superior a quatro na soma das seções "depressão" e "idéias depressivas"); (b) pontuação igual ou superior a dois na escala de gravidade dos sintomas para ansiedade/depressão; e (c) pontuação igual ou superior a oito nas sub-escalas de ansiedade/depressão da HAD10. Esse procedimento, bem como os pontos de corte utilizados, correspondem aos que foram anteriormente adotados nos estudos de validação10,14. Consideramos como presença de ideação suicida uma resposta afirmativa à questão 4 ou 5 da BSI11. A estimativa de grandeza para a variável apoio social foi dividida em três faixas, a fim de propiciar melhor desempenho estatístico: pequeno apoio social (0 a 2 pontos); médio (3 a 4 pontos); grande (4 a 6 pontos). Os dados foram codificados e inseridos no banco de dados Epi-Info, versão 6.0. Esse banco de dados foi transportado para o programa SAS, versão 6.12, no qual foram feitos testes de associações (Qui-quadrado, Fisher e o teste U de Mann-Whitney). RESULTADOS As principais características sociodemográficas das participantes deste estudo encontram-se na Tabela 1. Trinta e sete por cento haviam deixado a escola há mais de um ano. (Tabela 1). A média de idade do pai do bebê das adolescentes grávidas foi de 21,5 anos (DP = 4,8; variação: 15 - 50 anos). O tempo, em média, do relacionamento das adolescentes com os pais de seus bebês era de 18,5 meses (DP=14,6; variação: 1- 84 meses). A separação dos pais aconteceu na família de 50% das adolescentes, sendo que em 64,4% (n=38) ocorreu antes que as adolescentes tivessem 11 anos. Em 10,2% (n=6) dos casos, os pais nunca moraram juntos. A idade da mãe das adolescentes pesquisadas, em sua primeira gestação, teve como média 18,8 anos e mediana de 19 anos (DP = 3,1; variação: 12  28). O abuso físico foi relatado por 50 (41,6%) adolescentes, tendo sido perpetrado, na maioria das vezes, pelos genitores (pai: 21, mãe: 14, irmãos: 8, avós: 7). Dezenove (15,8%) adolescentes foram vítimas de abuso sexual (agressores: pai (3), padrasto (3), tio (2), avô (1), conhecidos (5), desconhecidos (5). A idade na menarca teve como média=12,2 anos (dp=1,3) e a idade na primeira relação sexual teve média = 14,6 anos (dp=1,6). Das 120 adolescentes, 55 (45,8%) tinham intenção de engravidar. A tentativa de aborto na gravidez atual foi relatada por nove (7,5%) adolescentes, e 10 (8,3%) delas relataram história de aborto anterior. Morbidade psiquiátrica: ansiedade, depressão e ideação suicida Sessenta adolescentes (50%) atingiram na CIS-R nível para suspeição de "caso" de morbidade psiquiátrica não-psicótica. Não houve diferença estatística nas prevalências de ansiedade, depressão e ideação suicida nos três trimestres gestacionais (Tabela 2). Doze adolescentes (10%) tinham ansiedade e depressão concomitantemente. À época deste estudo, 20 (16,7%) adolescentes relataram ideação suicida, oito (40%) também apresentavam ansiedade e depressão, cinco (25%) apresentavam apenas depressão, duas (10%) apresentavam apenas ansiedade. Cinco (25%) já haviam tentado suicídio anteriormente. Apenas cinco (25%) dessas 20 adolescentes não foram consideradas "casos" de ansiedade ou de depressão. Os resultados dos testes de associação entre ideação suicida e demais variáveis encontram-se na Tabela 3. Do total de participantes, 16 (13,3%) haviam tentado o suicídio anteriormente (dois no primeiro trimestre da atual gestação). Foram encaminhadas para um serviço de saúde mental 32 adolescentes (27%). No entanto, verificamos que apenas oito delas (25%) compareceram à consulta marcada. DISCUSSÃO Tanto quanto pudemos apurar, este estudo é, em nosso meio, o primeiro de cunho epidemiológico que fornece dados sobre ansiedade, depressão e ideação suicida em adolescentes grávidas, nos três trimestres gestacionais. Algumas limitações metodológicas devem ser consideradas: não se trata de um corte, mas sim de três amostras transversais, o que restringe extrapolações em termos de um continuum. A ausência de um grupo-controle impossibilita a comparação com adolescentes que não se encontram grávidas. O fato de a população estudada pertencer a um único estrato social também restringe o poder de generalização dos resultados. A utilização, no presente estudo, de vários instrumentos de pesquisa tem sido prática corrente na pesquisa epidemiológica em saúde mental. Isso porque, ao contrário do que ocorre na clínica, onde a experiência e a intuição do profissional são extremamente valorizadas, em pesquisas populacionais procura-se reduzir, por meio de instrumentos estruturados, o grau de subjetividade na coleta e na interpretação dos dados13. A determinação de depressão ou de ideação suicida, por exemplo, aqui não se baseou em apenas um "sim ou não" , porém na exploração das respostas a vários itens de instrumentos de pesquisa conhecidos e amplamente utilizados em epidemiologia psiquiátrica8-14. O fato de a história de abuso sexual e de abuso físico ter sido apurada sem a utilização de um instrumento detalhado, a nosso ver, pode ter conduzido a uma subestimação desses problemas, ainda que a maioria das entrevistadas tivesse parecido à vontade para se abrir a esse respeito. Quase a metade das adolescentes do presente estudo (45,83%) queriam engravidar, como ocorreu em outro estudo nacional, com 384 adolescentes grávidas avaliadas na Santa Casa de São Paulo15. A exemplo do que apuramos aqui, outros estudos também demonstraram que, dentre as adolescentes que desejavam ter o filho e estão casadas ou em união consensual, a maioria demonstra estar feliz, cumprindo o seu papel social16 e, muito provavelmente, realizando um desejo, consciente ou inconsciente, de ser mãe17. Embora muitos autores considerem a ansiedade como um sintoma comum a toda gravidez, nós não encontramos ansiedade em todas as adolescentes grávidas. As prevalências de sintomas de depressão (20,8%), assim como de ansiedade (23,3%), não apresentaram diferenças estatísticas entre os grupos dos três trimestres gestacionais. Embora haja menos casos de ansiedade no segundo trimestre, isso não foi estatisticamente significativo. Estes dados são discordantes dos obtidos por Viçosa18, que em um estudo de observação clínica por 10 anos, encontrou ansiedade mais elevada no primeiro trimestre, devido a preocupações em torno das relações com os pais, e, no terceiro trimestre, o surgimento mais freqüente de quadros depressivos. Lederman et al.19, realizando um estudo prospectivo de 32 primigestas, encontraram maiores níveis de ansiedade também no primeiro trimestre gestacional, com declínio no segundo e novamente um aumento com a proximidade do parto. As distinções entre formas de coletar dados (no caso do presente estudo por meio de instrumentos padronizados), bem como a maneira de interpretá-los, podem, pelo menos em parte, explicar essas discrepâncias. Comparando as prevalências de depressão em adolescentes grávidas com estudos realizados em adolescentes em geral, nossos achados estão acima dos 4,7% encontrados por Kashani et al.20 (n=150, 14 a 16 anos) e acima dos 4,5% encontrado por Serfaty et al.21 em 553 jovens de 18 anos, em Buenos Aires, para depressão maior. Esse último estudo, no entanto, quando adotou um critério mais exigente, considerando apenas os casos de "depressão moderada", mostrou uma porcentagem mais próxima à nossa: 26,6%. Como costuma ocorrer ao se examinar estudos epidemiológicos, esses números devem ser comparados com cuidado, devido aos distintos instrumentos que os autores utilizam, faixas etárias diferentes e, principalmente, critérios de definição de caso. A mesma discrepância relatada acima acontece ao compararmos a prevalência da ideação suicida com outros trabalhos. No presente estudo, a prevalência da ideação suicida (16,7%) está acima dos 4% encontrados por Soares (1994)22 numa população de jovens brasileiros entre 15 e 19 anos. Nesse último estudo, no entanto, o estabelecimento de presença ou ausência de ideação suicida baseou-se tão somente na formulação de uma única pergunta, o que, possivelmente, pode ter subestimado a freqüência de ideação suicida entre as jovens consultadas. Nossos dados estão próximos aos de Gonzalez-Forteza et al.23 que utilizaram, em um estudo transversal, uma escala de ideação suicida com quatro itens em 1712 mulheres adolescentes da Cidade do México: 11,8%. Mas estão abaixo do encontrado por Rey Gex et al.41, que realizaram um estudo transversal numa população de jovens (n= 9268) na Suíça, onde a prevalência de ideação suicida foi de 26%. Koniak-Griffin & Lesser25 observaram, em um estudo do tipo caso-controle, que 18% das adolescentes grávidas e pais adolescentes haviam considerado o suicídio e que 10% já o haviam tentado, número parecido com os 13% de adolescentes, que avaliamos, com história de tentativa pregressa. As adolescentes com ideação suicida (16,7% da amostra) eram predominantemente solteiras e contavam com pouco apoio social. Essas associações corroboram o que outros autores já haviam assinalado24,26,27. Também encontramos associação significativa entre ideação suicida e depressão/ansiedade24,28,29. Com base em nossos achados, concordamos com a revisão de Vásquez & Piñeros4, ao afirmar que a gravidez na adolescência apresenta um risco suicida elevado, tanto durante a gestação, quanto no pós-parto, associando-o a uma maior incidência de depressão e a uma percepção negativa da rede de apoio social. Esse perfil, no entanto, não se aplica a todas as adolescentes grávidas mas, especialmente a um subgrupo, em torno de um quinto do total, que manifesta ansiedade, depressão, ideação suicida e que conta com pouco apoio social. Para tal subgrupo, suas vidas não eram importante para alguém, algumas diziam que sua vida era importante para o futuro bebê. Uma das adolescentes que havia tentado suicídio quatro vezes e sofrido abuso sexual do pai, descreveu essa exclusão ou "falta" de um significado para vida de uma forma bastante clara: "Antes da gravidez eu tinha um buraco em mim, não sabia para onde ir, andava sem rumo, na bagunça. Agora estou cheia, o buraco foi preenchido, e sei que preciso cuidar de meu filho. Fiquei forte, parei com a bagunça, tenho para onde ir, meu filho precisa de mim". Seria esta uma tentativa de formar uma rede de apoio interna, já que a sociedade não ajuda neste sentido? Para Ayres et al.30, a exclusão dos processos comunicacionais, dos espaços institucionais e da cidadania plena seria um potente determinante de vulnerabilidade dos adolescentes aos danos decorrentes do uso de drogas, exposição à Aids e à gravidez precoce. "Eles estariam se arriscando com o necessário (...) restrito a poucas alternativas possíveis. (...) Quando só se pode escolher entre ser feliz correndo risco ou não ser feliz, o que a grande maioria de nós escolheria?". CONCLUSÕES Tendo em vista os objetivos deste estudo, pudemos concluir que as prevalências de depressão, ansiedade e ideação suicida apresentaram-se aproximadamente iguais nos diferentes trimestres gestacionais (Depressão: 27,5; 17,5; 17,5, respectivamente; média = 20,8. Ansiedade: 22,5; 15; 32,5, respectivamente; média = 23,3. Ideação suicida: 20; 15; 15, respectivamente; média = 16,7). A ideação suicida associou-se estatisticamente com a presença de depressão, ansiedade, pouco apoio social e estado civil solteira. Podemos concluir que as adolescentes grávidas apresentaram-se como um grupo heterogêneo: havia as que estavam felizes com sua condição, dizendo que tinham feito de tudo para estarem grávidas. Em outro extremo, havia adolescentes cuja gravidez aparecia como a única esperança em uma vida de muita violência e desespero. Sentiam-se sós, desamparadas, chegando a pensar em suicídio. Esse perfil aplica-se especialmente a um subgrupo, em torno de um quinto do total, que manifesta ansiedade, depressão, ideação suicida e que conta com pouco apoio social. Dessa forma, o atendimento pré-natal de adolescentes grávidas confirma-se como uma excelente oportunidade de se conjugar esforços de diferentes profissionais, a fim de melhorar a detecção e a condição psicossocial dessas gestantes e, conseqüentemente, de seus futuros bebês. SUMMARY Prevalence of depression, anxiety and suicide ideation in pregnant adolescents BACKGROUND: The purpose of this study was to determine the prevalence of depression, anxiety and suicide ideation among pregnant adolescents and verify the relationship between suicide ideation and other variables. METHODS: 120 pregnant adolescents (40 in each gestational trimester) attended at a public health center in Brazil were assessed. The following research instruments were used: the Clinical Interview Schedule (CIS-R), the Hospital Anxiety and Depression scale (HADS) and the Beck's Suicide Ideation Scale (BSI). The Chi-square test, the Fisher´s and the Mann-Whitney U tests were performed. Results: There were 28 cases of anxiety (23.3%), 25 (20.8%) of depression and 20 cases of suicide ideation (16.7%). There was no difference in these prevalences in the gestational trimesters. There was a significant relationship between suicide ideation suicide and depression (p = 0.001), single individuals without boyfriends (p = 0.01) and little social support ( p = 0.001). Cases of suicidal ideation presented a high frequency of lack of concentration, anxiety, depression, preoccupations, obsessions, depressive ideas, tiredness, worries concerning body functions and compulsions. CONCLUSION: The group of pregnant adolescents showed heterogeneous results regarding mental health. The most common symptom of depression, anxiety, ideation suicide and previous suicide attempts were depressive ideas. The health professionals working with pregnant adolescents should observe them carefully, in order to detect the presence of depressive ideas. [Rev Assoc Med Bras 2002; 48(3): 245-9] KEY WORDS: Adolescence. Pregnancy. Suicide attempt. Depression. Anxiety. REFERÊNCIAS 1. Datasus. Banco de dados do Sistema Único de Saúde 1999. Disponível em: http://www.datasus.com.br. [ Links ] 2. 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